
Durante o julgamento desta segunda-feira (22), o ministro Alexandre de Moraes, relator das ações contra os envolvidos no chamado “núcleo 2” dos atos de 8 de janeiro, fez uma comparação que acendeu o alerta para o crescente ativismo judicial no país. Em tom provocativo, questionou se quem pede anistia hoje teria a mesma postura caso os “invasores” tivessem entrado em suas casas. A fala, carregada de emoção, substitui argumentos jurídicos por apelos sentimentais.
A analogia é desonesta. Os prédios públicos — STF, Congresso e Palácio do Planalto — não pertencem a ministros nem ao presidente da República. São patrimônios da nação, símbolos do poder popular. Tratá-los como residências privadas é confundir deliberadamente o papel institucional com a vaidade pessoal de quem ocupa o cargo.
Esse tipo de discurso apenas reforça a perigosa tendência do Judiciário se colocar acima da própria Constituição. A discussão sobre anistia não diz respeito a “perdoar por compaixão”, mas sim ao direito de revisão proporcional das penas, à individualização das condutas e à separação entre protesto e crime político. Não se pode tratar todos como criminosos apenas para sustentar uma narrativa de vingança.
A função de um ministro da Suprema Corte não é ser vítima, promotor ou justiceiro. É ser guardião da Constituição, aplicando a lei com equilíbrio e imparcialidade. Quando um ministro adota o papel de parte emocional do processo, perde-se a isenção que deve nortear suas decisões.
O uso de retórica inflamável em julgamentos tão sensíveis coloca em risco a credibilidade da Justiça. Mais do que frases de efeito, a sociedade espera posturas sóbrias e fundamentadas. A toga não deve ser usada para aplausos fáceis nem para alimentar disputas políticas travestidas de decisões legais.
Se o critério para julgar passa a ser a dor subjetiva de quem julga, então a Justiça já não se baseia mais em princípios, mas em ressentimentos. E esse, definitivamente, não é o caminho que o Brasil precisa seguir.