
Um jornalista militante conseguiu se infiltrar no grupo de WhatsApp “Empresários & Política” e fazer o vazamento de conversas privadas.
Trata-se de Lucas Mesquita, jornalista de 35 anos que ocupa cargo no governo Lula. A descoberta aconteceu após análise de documentos apresentados pelo perito Eduardo Tagliaferro em audiência na Comissão de Segurança Pública do Senado Federal na última terça-feira (2).
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O vazamento serviu como fundamento para uma operação de busca e apreensão autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes contra empresários, incluindo Luciano Hang e Meyer Nigri, às vésperas das eleições de 2022. Tagliaferro, ex-assessor de Moraes no STF, afirmou que documentos técnicos que deveriam embasar a decisão judicial teriam sido produzidos com datas retroativas.
O perito declarou que as mensagens do grupo foram enviadas a ele pela pessoa identificada como “Bruxa” no caso Vaza Toga. Esta revelação adiciona elementos ao caso Vaza Toga 2, no qual Moraes teria autorizado o uso de “parceiros externos” para estruturar investigações.
Mesquita começou sua carreira como assessor de imprensa da chapa Dilma-Temer nas eleições de 2010. Posteriormente, direcionou sua atuação para produção audiovisual, fundando uma microempresa de produção fotográfica e cinematográfica em Brasília.
Mesquita infiltrou-se em pelo menos dois grupos de WhatsApp ligados à direita política. Um deles foi o Parlatório, que reunia cerca de 250 empresários, intelectuais, jornalistas e políticos, incluindo o ex-ministro Sergio Moro.
Durante aproximadamente dois a três anos, permaneceu como observador silencioso, sendo notado apenas quando criticou a reaproximação entre Moro e Bolsonaro. Na ocasião, chamou o ex-juiz de “tchutchuca de miliciano”, o que resultou em sua remoção do grupo.
No “grupo dos empresários”, Mesquita tentou ocultar sua orientação política. Em abril de 2022, escreveu: “Infelizmente vai ser segundo turno entre Lula e Bolsonaro. Mas ainda tenho esperança de alguém conseguir aglutinar as forças de centro e ir pro segundo turno, para aí sim derrotar Lula ou Bolsonaro”.
Em maio de 2022, o jornalista Guilherme Amado publicou a primeira reportagem com conteúdo vazado do grupo, focando em declarações de Hang sobre o padre Julio Lancellotti. Os integrantes tentaram identificar o “X9”, mas não suspeitaram de Lucas. Hang foi condenado a pagar R$ 8 mil de indenização a Lancellotti.
Após a publicação, Hang manifestou-se: “Pessoal aqui no grupo temos um X9, um dedo duro. Olha só onde foi parar a nossa conversa aqui no grupo. O membro que teve coragem de passar as mensagens para a imprensa também deveria ter a coragem de se posicionar agora e dizer o porquê fez isso. O que quis deixar bem claro na minha posição foi a militância do Lancellotti em apoiar um líder que defende o comunismo pelo mundo e pela América Latina que são geradores da miséria. Não sou contra a parte social, falei dele, desse caso específico, da militância de esquerda”.
Em 17 de agosto de 2022, o Metrópoles publicou reportagem com as conversas do grupo. A equipe de Amado contatou os integrantes solicitando posicionamentos. Mesquita também perguntou aos demais o que deveria responder, aparentemente para desviar suspeitas.
Em janeiro de 2024, Mesquita foi nomeado assessor no Ministério do Empreendedorismo, comandado por Márcio França. Ele mantém perfil discreto nas redes sociais, mas registra encontros com figuras como Lula, Flávio Dino e Alexandre de Moraes.
Tagliaferro relatou que, em agosto de 2022, recebeu ordens de Airton Vieira, assessor de Moraes, para elaborar documentos que fundamentariam a operação policial. Havia urgência para executar as buscas, realizadas em 23 de agosto, menos de uma semana após a publicação da reportagem do Metrópoles.
Entre as mensagens citadas estava a frase “Prefiro golpe do que a volta do PT. Um milhão de vezes”, atribuída a um dos participantes. Hang teve seus perfis nas redes sociais bloqueados apenas por participar do grupo.
A operação da Polícia Federal foi realizada em cinco estados. As contas de Hang permaneceram bloqueadas por mais de dois anos, sendo reativadas apenas em setembro de 2024.
Em agosto de 2023, o STF arquivou o inquérito relacionado a seis dos oito empresários investigados por “ausência de justa causa”. Apenas os casos de Hang e Meyer Nigri foram mantidos por mais 60 dias.
Tagliaferro declarou que, após a operação, foi procurado por Airton Vieira para “ajudar a construir uma história”. O objetivo seria forjar evidências de uma investigação prévia que justificasse a ação do STF.
“Assinei como se fosse um relatório do Supremo Tribunal Federal. Mas eu não era servidor nomeado. Fiz porque fui instruído. E está tudo documentado: os arquivos, as datas de criação, os metadados, os hashes. Tudo com perícia técnica”, afirmou Tagliaferro.
O perito apresentou capturas de tela e o mapa mental que, segundo ele, foi utilizado por Moraes para justificar as medidas judiciais. No mapa, os empresários apareciam vinculados a nomes como “Custer”, “Bezerra” e “Álvaro dos Santos”.
Durante a audiência, Tagliaferro questionou: “Essa fraude é gravíssima. Se isso foi feito nesse processo, o que não pode ter sido feito em outros, todos físicos, todos guardados a sete chaves no gabinete do ministro?”.
No vídeo abaixo, o “X9” aparece hostilizando o deputado Nikolas Ferreira:
Jornal da cidade