
A colunista Eliane Cantanhêde, do Estadão, usou seu espaço para exaltar Alexandre de Moraes como “líder da resistência” contra os chamados golpistas. Repetiu o termo não uma, mas duas vezes, reforçando a narrativa como se fosse um título heroico. A comparação, no entanto, soa absurda quando lembramos que, historicamente, líderes de resistência enfrentaram regimes opressores sem qualquer aparato estatal para protegê-los.
No passado, figuras como Nelson Mandela, que passou quase 30 anos na prisão, ou Willman Mendoza, dissidente cubano morto após greve de fome, e Alexei Navalny, opositor de Putin envenenado e morto sob circunstâncias suspeitas, encarnaram de fato a resistência. Eles lutaram contra o poder, e não a partir dele. Resistência, por definição, é o ato de enfrentar o poder — não exercê-lo com mão de ferro.
Atribuir coragem a quem já detém todos os instrumentos do poder é distorcer a lógica. Quem tem o poder não precisa resistir, precisa ser contido para não abusar dele. Alexandre de Moraes, com escolta armada e avião da FAB à disposição, não vive sob risco real. O exemplo da família constrangida no aeroporto de Roma mostra bem como esse poder pode se voltar contra cidadãos comuns.
Agora, com a aplicação da Lei Magnitsky e sanções internacionais, Moraes começa a sentir algum custo pessoal. Ainda assim, está longe de enfrentar o destino de um verdadeiro resistente. Continuará a desfrutar de privilégios e conforto que nenhum preso político da história teve. Heróico? Só para quem confunde poder com bravura.
No fim das contas, quem resiste mesmo é o leitor que, como o autor do texto original, encara diariamente a coluna de Cantanhêde. Resistência, aqui, é aguentar a narrativa sem desistir no meio do caminho. E, convenhamos, isso exige mais coragem do que viajar de jatinho oficial para ver jogo de futebol.
