Na manhã desta segunda-feira (18), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu início à 1ª jornada da Cúpula de Líderes do G20, grupo composto pelas 19 maiores economias do mundo, além da União Europeia e da União Africana. Em seu discurso, Lula abordou temas centrais para o Brasil, com destaque para a crítica ao alto investimento em conflitos militares em detrimento do combate à fome global, uma das bandeiras de sua administração.
Em seu pronunciamento, o presidente brasileiro destacou a atual situação de fome no Brasil, mencionando que 33 milhões de pessoas estavam afetadas durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o que resultou no retorno do país ao “mapa da fome”. Lula prometeu reverter esse quadro até 2026, informando que, desde o início de sua gestão, 24 milhões de brasileiros foram retirados da extrema pobreza.
O presidente ainda reforçou que a fome é consequência de escolhas políticas erradas e que é “inaceitável” que, com os elevados gastos militares globais – que chegam a U$ 2,4 trilhões (cerca de R$ 13,8 trilhões) –, a fome persista em um mundo com tanta produção de alimentos.
Sob a presidência do Brasil, a Cúpula do G20 tem como eixos principais o combate à fome, as mudanças climáticas e a reforma das instituições de governança global, como a ONU. Embora o G20 não tenha poder de legislar, ele busca fomentar compromissos entre seus membros em áreas como políticas econômicas, sociais e de governança. O Brasil assume a presidência do bloco pela primeira vez em sua história. Em 2025, o comando será transferido para a África do Sul, seguindo a tradição de rotação anual da liderança.
Eis a íntegra do discurso de Lula na abertura do G20:
Caros chefes de Estado e de Governo, dirigentes de Organizações Internacionais, demais chefes de Delegação, minhas amigas e meus amigos: sejam bem-vindos ao G20. Sejam bem-vindos ao Rio de Janeiro.
Esta cidade é a síntese dos contrastes que caracterizam o Brasil, a América Latina e o mundo. De um lado, a beleza exuberante da natureza sob os braços abertos do Cristo Redentor. Um povo diverso, vibrante, criativo e acolhedor. De outro, injustiças sociais profundas. O retrato vivo de desigualdades históricas persistentes.
Estive na 1ª reunião de líderes do G20, convocada em Washington no contexto da crise financeira de 2008. Dezesseis anos depois, constato com tristeza que o mundo está pior. Temos o maior número de conflitos armados desde a 2ª Guerra Mundial e a maior quantidade de deslocamentos forçados já registrada.
Os fenômenos climáticos extremos mostram seus efeitos devastadores em todos os cantos do planeta. As desigualdades sociais, raciais e de gênero se aprofundam, na esteira de uma pandemia que ceifou mais de 15 milhões de vidas.
O símbolo máximo na nossa tragédia coletiva é a fome e a pobreza. Segundo a FAO, em 2024, convivemos com um contingente de 733 milhões de pessoas ainda subnutridas. É como se as populações do Brasil, México, Alemanha, Reino Unido, África do Sul e Canadá, somadas, estivessem passando fome. São mulheres, homens e crianças, cujo direito à vida e à educação, ao desenvolvimento e à alimentação são diariamente violados.
Em um mundo que produz quase 6 bilhões de toneladas de alimentos por ano, isso é inadmissível. Em um mundo cujos gastos militares chegam a 2,4 trilhões de dólares, isso é inaceitável.
A fome e a pobreza não são resultado da escassez ou de fenômenos naturais. A fome, como dizia o cientista e geógrafo brasileiro Josué de Castro, “a fome é a expressão biológica dos males sociais”. É produto de decisões políticas, que perpetuam a exclusão de grande parte da humanidade.
O G20 representa 85% dos 110 trilhões de dólares do PIB mundial. Também responde por 75% dos 32 trilhões de dólares do comércio de bens e serviços e dois terços dos 8 bilhões de habitantes do planeta.
Compete aos que estão aqui em volta desta mesa a inadiável tarefa de acabar com essa chaga que envergonha a humanidade. Por isso, colocamos como objetivo central da presidência brasileira no G20 o lançamento de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Este será o nosso maior legado.
Não se trata apenas de fazer justiça. Essa é uma condição imprescindível para construir sociedades mais prósperas e um mundo de paz.
Não por acaso, esses são os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 1 e 2 da Agenda 2030.
Com a Aliança, vamos articular recomendações internacionais, políticas públicas eficazes e fontes de financiamento.
O Brasil sabe que é possível.
Com a participação ativa da sociedade civil, concebemos e implementamos programas de inclusão social, de fomento da agricultura familiar e da segurança alimentar e nutricional, como o nosso Bolsa Família e o Programa Nacional de Alimentação Escolar.
Conseguimos sair do Mapa da Fome da FAO em 2014, para o qual voltamos em 2022, em um contexto de desarticulação do Estado de bem-estar social.
Foi com tristeza que, ao voltar ao governo, encontrei um país com 33 milhões de pessoas famintas.
Em um ano e onze meses, o retorno desses programas já retirou mais de 24, 5 milhões de pessoas da extrema pobreza.
Até 2026, novamente sairemos do Mapa da Fome.
E com a Aliança, faremos muito mais.
Aqueles que sempre foram invisíveis estarão ao centro da agenda internacional.
Já contamos com a adesão de 81 países, 26 organizações internacionais, 9 instituições financeiras e 31 fundações filantrópicas e organizações não-governamentais.
Meus agradecimentos a todos os envolvidos na concepção e no funcionamento desta iniciativa, que já anunciaram contribuições financeiras.
Foi um ano de trabalho intenso, mas este é apenas o começo.
A Aliança nasce no G20, mas seu destino é global.
Que esta cúpula seja marcada pela coragem de agir.
Por isso quero declarar oficialmente lançada a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.
Muito obrigado.
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